quarta-feira, 6 de junho de 2018

O Cordel Estradeiro voltou

Como já comentei em texto anterior, minha vida é toda musicada. Nos anos 2000, sem dúvida, minha trilha sonora frequente foi "Cordel do Fogo Encantado". Na época, não fui atrás da história da banda, das suas origens, das suas referências. Apenas me apaixonei. Desde o primeiro show, na Choperia do Sesc Pompéia, aquele grupo, com nome curioso, com interpretação enérgica e totalmente teatral, com poesias alternadas às músicas, me ganhou pra sempre. Já adianto que só entende totalmente o que é o show do Cordel quem já vivenciou. A apresentação desses meninos (meninos sempre, porque a energia deles não corresponde à idade definitivamente) é um acontecimento, uma explosão de alegria, de poesia e de força. Eles ficaram 8 anos distantes dos palcos e agora, para a alegria de quem é fã, como eu, e para sorte de quem ainda pode ir atrás de conhecê-los, voltaram. Voltaram com cd novo e com turnê pelo Brasil.

Em entrevista à Roberta Martinelli, na Rádio Eldorado, dias antes dos 3 shows de SP, Lira, o vocalista do Cordel, contou que a grande motivação para o resgate da banda foi a morte de Naná Vasconcelos. Naná foi como um padrinho da banda, acompanhou-os por anos, foi produtor do primeiro cd (de 2001) e sempre foi (e é) uma forte referência musical para o Cordel. Na entrevista, Lira disse que, no encontro dos músicos no velório de Naná, surgiu a decisão, a necessidade de resgate da banda, de sua história e de produzir um novo trabalho, uma homenagem. A homenagem aconteceu. E que homenagem! Um novo trabalho lindo, enérgico, alegre. Aliás, alegria foi o que mais vi no momento do show, tanto nos fãs (que, como sempre, lotaram totalmente o espaço do Sesc nos 3 dias de shows) quanto nos integrantes da banda, que deixavam explícita a emoção da volta.

O auge da banda aconteceu numa época em que, acredito, as pessoas se entregavam mais ao momento do show, não o desperdiçavam, sem perceber, como acontece atualmente. Hoje os celulares marcam presença (e atrapalham a visão e concentração de quem está atrás) para dar a ilusão de que se está aproveitando, registrando tudo para ver depois ou pra mostrar nas redes sociais, mas na verdade estão roubando algo tão especial, que só acontece ali, ao vivo... a troca de energia, a entrega, sem interferências externas. No show do Cordel desse último domingo fiquei positivamente surpresa, notei que havia menos celulares do que a média usual em shows. Ali você tem que escolher... ou pula ao ritmo da percussão contagiante ou fica parado gravando. A maioria optou pela primeira opção. Cordel tem esse poder. 

Eu tenho o DVD, de um registro feito pela MTV em 2003 na Casa das Caldeiras. Sabem quantas vezes assisti? Uma, duas no máximo. Eu estava lá no dia da filmagem (obrigada, César, meu amigo querido, pelos ingressos!) e o ao vivo é insuperável. Até a volta da banda, se me dava vontade de matar as saudades, eu recorria aos cds, que me bastavam para trazer todas as memórias de volta. Costumo ouvir no carro e num dia desses percebi que Sofia e Tomás, no banco de trás, estavam fazendo comentários cochichados, dando risadinhas, entre eles sobre as músicas do Cordel que eu cantava empolgadamente.


"Ê nunca mais eu vi 
Os oím do meu amor 
Nunca mais eu vi 
Os oím dela brilhar"  (trecho de Os oim do meu amor)


"Meu moxotó coroado
De xiquexique facheiro
Onde a cascavel cochila
Na boca do cangaceiro" (trecho de Cordel Estradeiro)


- Por que vocês estão rindo? - perguntei
- Mãe, ele fala tudo errado. A gente não está entendendo nada!!! - Sofia respondeu

Em vão, tentei explicar, mas eles já estavam se divertindo mais em não entender nada, não deram a menor atenção... Resumindo o que tentei dizer para eles: 

"Prazer, crianças, isso é 'pernambuquês', isso é Cordel. Não tentem entender, apenas ouçam e, de preferência, ao vivo!"